A pauta era uma reintegração de posse. Condomínio de apartamentos de 45 metros quadrados, inacabados, num lugar que, com o taxista nos deixando apavorados com velocidade e alguns abusos pra que fôssemos (d)os primeiros, levamos ainda uns bons 60 minutos pra chegar.
O cheiro de bombas de gás -- bombas lançadas também de um helicóptero policial, veja que coisa, minino --, gente chorando, gente dizendo que havia "crianças mortas". Gente jogando pedras em policiais. Policiais devolvendo com mais bombas. Xingamentos mútuos e feios --tive um upgrade momentâneo de repertório, mas, ufa, já esqueci.
De repente, horas mais tarde, notei que aquela fileira de homens sisudos e de fardas grossas, naquele calor absurdo, começavam a querer desmoronar --de sono. Um deles, de pé no fim de uma fila de uns 30, cochilava, balançava levemente pra frente e 'acordava' novamente. Outros dois cochilavam sentados na calçada suja enquanto os companheiros tapavam, desastradamente, a visão que se tinha da cena.
Dias depois, a pauta de uma manifestação no centro. Difícil definir o turbilhão de emoções, algumas muito ruins, nocivas, de ver pessoas sendo arrastadas pelo colarinho simplesmente por serem pedra no caminho. Muito, muito difícil ouvir aquele cidadão bem vestido, uns 40 anos, e uns moleques mascarados, tênis Asics e Nike nos pés, gritando "Não vai ter soldo!" à faixa gigante que mais parecia um desfile militar fora de época. Desfile gigante, por sinal, de pessoas que tiveram a folga limada para estar ali.
De repente, horas mais tarde, o amigo mostrou entre as fotos a de um coldre vazio, na cintura milica, ao lado de um crucifixo, de madeira, pra fora do bolso.
Afinal, ser humano mudou pra estar humano e não nos avisaram? Ou avisaram, mas ignoramos?
25.2.14
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